Em 14 de abril de 2025, o Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão nacional de todos os processos que discutem a validade da contratação de pessoas físicas por meio de CNPJ para prestação de serviços.
A medida, adotada no âmbito do Tema 1389 de repercussão geral, paralisa o julgamento de ações trabalhistas sobre o tema em todas as instâncias do país.
A controvérsia gira em torno de modelos contratuais amplamente utilizados no mercado, especialmente em áreas como tecnologia, saúde, comunicação, consultoria e entretenimento.
O STF analisará, de forma definitiva: (i) A validade constitucional e trabalhista da contratação de pessoas físicas por meio de CNPJ; (ii) A competência da Justiça do Trabalho para apreciar alegações de fraude, mesmo diante de contratos civis ou comerciais; (iii) A distribuição do ônus da prova, ou seja, se cabe ao trabalhador ou ao contratante demonstrar a presença – ou ausência – de vínculo empregatício.
A decisão do ministro também visa conter o crescente número de reclamações constitucionais que chegam ao STF, nas quais empresas alegam que a Justiça do Trabalho estaria desconsiderando contratos civis legítimos, violando precedentes da Corte Suprema.
É importante distinguir este julgamento do Tema 725, já apreciado pelo STF, que versou sobre a possibilidade de terceirização de qualquer atividade, inclusive a atividade-fim, entre pessoas jurídicas distintas. Já o Tema 1389 é mais sensível: trata de relações diretas entre empresas e profissionais que, embora formalmente contratados como “pessoa jurídica”, exerceriam suas atividades de forma contínua, pessoal e subordinada, preenchendo os requisitos para reconhecimento do vínculo de emprego, o que pode configurar fraude às leis trabalhistas.
Até aqui, a jurisprudência trabalhista tem se baseado em critérios clássicos – pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação – para decidir se há ou não vínculo de emprego, tendo a competência embasada na previsão contida no artigo 114, I, da Constituição Federal.
Com a suspensão dos processos, reabre-se uma janela estratégica para que empresas reavaliem seus modelos contratuais e adotem medidas preventivas, tendo em vista que, com base no princípio do contrato realidade, a mera formalização de um contrato de prestação de serviços não seria suficiente para a descaracterização de uma relação empregatícia. Com efeito, a decisão ora em debate não representa uma autorização tácita para a contratação indiscriminada por CNPJ, mas, sim, uma pausa para reflexão institucional e jurídica.
Recomendações para as empresas:
1. Revisarem os contratos vigentes: Atente-se para cláusulas que possam indicar exclusividade, controle hierárquico ou integração do prestador à estrutura da empresa.
2. Evitarem elementos de subordinação: A gestão de prestadores deve preservar sua autonomia operacional, evitando práticas típicas da relação empregatícia, como ordens diretas ou controle de jornada.
3. Analisarem o grau de dependência econômica: Contratos com remuneração fixa mensal e ausência de outros clientes podem ser interpretados como indicativos de vínculo.
4. Monitorarem o julgamento: A tese fixada pelo STF será de observância obrigatória, podendo impactar modelos amplamente adotados no mercado.
Além disso, dois Incidentes de Recursos Repetitivos em trâmite no Tribunal Superior do Trabalho (TST) tratam de matérias semelhantes, o que sinaliza uma tendência de uniformização interpretativa sobre a contratação de pessoas jurídicas, visando trazer maior segurança jurídica tanto para empresas como para trabalhadores.
Essa suspensão representa um marco relevante, com potencial para redefinir as fronteiras entre a autonomia contratual e a proteção trabalhista no Brasil, à luz dos novos contornos da relação de trabalho no século XXI. Este é o momento ideal para que as empresas fortaleçam suas práticas de compliance trabalhista, revisem seus modelos contratuais e se antecipem a potenciais passivos — evitando, assim, surpresas quando a tese do STF for fixada.